por Laísa Trojaike
Hoje, acordei mulher novamente. A maioria das rosas do 8M já murcharam, outras tantas já foram parar no lixo e os meios de comunicação já estão desacelerando os debates que só serão retomados no oito de março do próximo ano. Queremos celebrar, mas para muitas de nós não há o que comemorar, sobretudo quando nossa luta é reduzida a datas comemorativas e presentes. Já é 2025 e ainda não é confortável ou seguro ser mulher. Vamos ter que esperar o agosto lilás para poder falar sobre isso?
Em fevereiro deste ano, o Laboratório de Estudos de Feminicídio (LESFEM) da Universidade Estadual de Londrina publicou um estudo sobre os feminicídios consumados e tentados no Brasil em 2024. Nos gráficos, “São Paulo, Paraná e Minas Gerais lideram em números absolutos” e não podemos esquecer que estamos na região metropolitana de um desses estados. Em Colombo, não há dados sobre as estatísticas locais nas páginas oficiais do município.
No final de semana “da mulher”, caminhei pelo bairro. Em algumas casas havia comemoração, famílias reunidas, música, preparativos para o jantar… E as imagens se repetiam. Em quase todos os lares, as mulheres estavam trabalhando na organização e limpeza dos espaços, além de serem as principais figuras que ocupavam as cozinhas, mesmo no dia em que elas deveriam ter suas lutas celebradas. Enquanto isso, os homens também reproduziam os padrões: sentados, bebendo, curtindo a música, tendo no máximo o churrasco como responsabilidade. Para muitas de nós, foi mais um dia de trabalho doméstico dobrado.

Projeto da Escola Estadual Presidente Kennedy, no Rio Grande do Sul, criou mural com frases usadas por agressores (Imagem: Ronaldo Bernardi / Agência RBS)
Não foi assim em todas as casas. Nem todos os homens são machistas. Sabemos disso, mas os números continuam nos assombrando. Além dos dados sobre machismos, violências e feminicídios, existem outros indícios que nos fazem questionar se realmente somos valorizadas e respeitadas. Não temos os dados sobre crimes contra a mulher em Colombo, mas é igualmente inaceitável o fato de termos 0% de representação feminina na Câmara de Vereadores do município. Isso significa que temos apenas homens (cis) representando a população colombense: nenhum deles sangra todo mês, nenhum deles sabe o que é gestar um filho, nenhum deles sabe o que é amamentar ou, enfim, ser mulher.
Como humanos, somos todos iguais, independente do gênero. Mas é inegável que diferentes grupos de pessoas têm suas particularidades. Ao longo da história, fomos inúmeras vezes descritas como seres inferiores e frágeis, ignorando que apenas nós temos a capacidade de gestar vida, como bem lembra a pensadora tanzaniana Efu Nyaki: “Metade do mundo são mulheres. A outra metade, os filhos delas.”
Alguns corpos femininos acumulam outras violências e, além do machismo, podem ser alvo de racismo, lgbtfobia, xenofobia, preconceito de classe… Alguns corpos acumulam mais de uma camada de violência. E piora. Até agora, pensava sobre jovens e adultas, mas também precisamos falar sobre as violências físicas, psicológicas, sociais e históricas que sofrem nossas meninas, algumas antes mesmo de aprender a falar “mulher”.
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Os gráficos do LESFEM nos dizem que tentam nos matar mais aos domingos; que geralmente nossos agressores são parceiros, ex-parceiros, familiares e outras pessoas com quem temos vínculos; e que, na maioria das vezes, eles usam armas brancas, embora os casos com armas de fogo também tenham aumentado. Muitas delas eram mães.
Os dados também revelam o que não sabemos: informações incertas, situações que não foram reportadas ou denunciadas, casos que estão acontecendo no período em que escrevo este texto, desaparecidas, crimes que não foram reconhecidos como feminicídio, relatos que não foram levados a sério pela polícia… Enquanto você lê, uma mulher (ou muitas) estão passando por uma situação de assédio ou violência. Enquanto você está pensando ou pesquisando para saber se isso é verdade ou não, mais uma mulher foi assassinada. É nessa frequência que tem acontecido.
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E agora pergunto: você conhece alguma mulher que nunca sofreu alguma espécie de assédio, violência ou desvalorização justamente pelo fato de ser mulher? É assustador estar em uma roda apenas com mulheres e constatar que todas elas têm alguma história para contar. É terrível, porque sabemos que elas não estão nos dados: conhecemos muitas mulheres estupradas que não denunciaram, que não contaram para os familiares ou amigos, que não se abriram para quase ninguém. Além do medo e da violência, ainda é frequente sofrermos sozinhas, sem apoio algum.
Acontece que não foi sempre assim e não precisa ser como é. As mulheres precisam entender que são poder e força, que têm voz e que, sem nós, o mundo pára. Procure apoio, converse, observe e, se puder, denuncie. Consuma mais conteúdos feitos por mulheres, escute as pessoas que passam pelas mesmas dificuldades que você.
Mulher, saiba que você não está sozinha.
Escuta elas
Esse grito não é apenas meu ou seu. Muitas mulheres estão na mesma luta, mesmo aquelas que não conhecemos. Às vezes, a resistência vem da arte e muitas apostaram nessa ferramenta para gritar ainda mais alto enquanto tentam nos calar. Leia, veja, estude e escute mulheres:
- Marília Mendonça & Maiara e Maraisa – Você Não Manda Em Mim;
https://youtu.be/Nj_VnWf6OPM?si=EZvMsQtKkZCT_abT
- Negra Li – Mina (com Tradutora Intérprete de Libras);
https://youtu.be/29a_Bx4HkJM?si=m65QyLwjRCaJFouk
- Lauana Prado – Tem Que Respeitar;
https://youtu.be/8YSlO1ocxaI?si=6xRvXtz4ZJcoU0qG
- Elza Soares – Maria da Vila Matilde;
https://youtu.be/-09qfhVdzz8?si=1cwHrFEBl-lVfvRC
- Atitude Feminina – Rosas;
https://youtu.be/AJCrOpvCPN0?si=SCOgrUlHhN_OFa62
- MC Carol – LEVANTA MINA (feat. DJ Thai)
https://youtu.be/5EUBHEh5Ue8?si=kPo7Sl8wjR4BTzx6
- Francisco, el Hombre – Triste, Louca ou Má;
https://youtu.be/lKmYTHgBNoE?si=bdWSeE5NCDLpuvdc
- Drik Barbosa – Liberdade part. Luedji Luna e R.A.E
https://youtu.be/3qdKnXaQ8Zw?si=CMNn0i_ZcQphPigF
- Mulamba – Mulamba;
https://youtu.be/353TNXIcUrA?si=VMJd2SxXTGB0LB-s
- Iza – Dona de Mim;
https://youtu.be/FnGfgb_YNE8?si=2jT57g06pF5eKQTi
Fonte – LESFEM:
https://sites.uel.br/lesfem/monitor-brasil/feminicidios-consumados-e-tentados-no-brasil-2024/