As enchentes do Rio Grande do Sul afetaram a produção agrícola do estado, principalmente de arroz, soja e trigo, e a pecuária. A logística foi comprometida, com estradas obstruídas por barreiras e pontes que caíram. Isso deve impactar, além do abastecimento do estado, os preços dos alimentos no país.
A expectativa, segundo economistas, é um aumento de preços nesses produtos nas próximas semanas, devido à calamidade pública no estado.
“Grande parte da safra já tinha sido colhida, e acredito que esteja salva, porém, as estradas estão com problema, e o escoamento dos produtos para outros estados terá dificuldade, e isso vai encarecer, vai demorar para chegar. E quando chegar, vai chegar com o preço já inflacionado”, afirma Cristiane Meleiro, coordenadora do curso de Ciências Contábeis da Faculdade Anhanguera.
Para ela, ainda não é possível mensurar quanto isso vai ter de impacto. “Mas a gente espera sim aumento no arroz, principalmente, em algumas carnes bovinas, alguns derivados da soja e também na ração. Então a gente pode ter, por consequência disso, um aumento nos ovos, no frango e na carne”, acrescenta Cristiane.
O economista Rubens Moura, professor de ciências econômicas da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio, explica que, apesar da colheita de grãos ter chegado a 83% em média, o escoamento da produção vai ser prejudicado em função do alagamento. O que vai provocar atraso na entrega, gerar aumento no custo de transporte, no seguro, encarecendo o custo de produção.
“Haverá aumento de preço. Nesse caso, vai ser um aumento um pouco mais perverso no arroz. Além de ter produção menor em função das chuvas e problema de escoamento, houve aumento da exportação. O arroz, que já estava caro, vai ficar mais caro ainda”, avalia Moura.
Ele destaca também que o Rio Grande do Sul é um grande produtor de trigo, soja, milho e outras commodities que servem para produzir ração. “Devido à chuva, que atrapalhou o final da colheita e a distribuição dessas commodities, a ração vai ficar mais cara. Com isso, o preço da carne vai aumentar”, afirma.
A pós-tragédia também poder ter impacto nos preços. Segundo ele, com a calamidade pública, as licitações das obras ficam menos exigentes. “O pós-tragédia vai ficar muito caro para o governo, que terá que fazer obras emergenciais. Vai ter muita oferta para serviço público e aumento dos insumos de construção. Reformar rua, casa, estrada, pontes, tudo vai ficar mais caro”, analisa o economista.
A economista Carla Beni, professora de MBAs da FGV, afirma que, no transporte, já estão ocorrendo correções nos contratos de logística. “O que tinha sido contratado, por exemplo, para entregar em junho e julho, está sendo prorrogado para entregar em agosto, porque já está tendo problema de logística”, explica Carla.
“Tem a parte de grãos separada por regiões do estado entre o que já teve colheita, que está menos afetada, e outra parte que tem os silos afetados. Algumas imagens mostraram que o próprio silo foi tombando, aí você tem a perda total do estoque. Se o silo tombou, você perdeu a produção”, avalia a economista.
Para ela, ainda não é possível saber o impacto na inflação. “Você tem uma escala de problemas, que vai depender da intensidade que você vai conseguir superar. Por exemplo, o arroz tem tolerância maior à umidade, então pode ser que a produção de arroz, se tiver escoamento mais rápido da água, você não tem perda tão grande. Agora a soja, já não, porque não consegue suportar tanta umidade. Se não tiver ecoamento e entrada de sol rápidos, o grão estufa e você perde grande parte da produção”, analisa.
Carla cita a importância da recuperação do estado do Rio Grande do Sul, com a estrutura federal, estadual e municipal, para que as políticas públicas passem a contemplar a mudança do clima.
“Que isso seja muito importante para entender que as condições climáticas vieram para ficar, que as políticas públicas são fundamentais para entender que nós precisamos pensar a produção dos nossos alimentos de outra forma. O Brasil tem que pensar a produção, armazenagem, silagem e transporte de outra forma, porque as questões ambientais vieram para ficar”, conclui a economista.